Tite e a Redução do Homem





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Alessandro Caldeira


Uma semana após manifestantes bolsonaristas invadirem as ruas protestando contra a eleição de Lula, a Seleção Brasileira tem sua lista final para buscar o sonho do hexacampeonato na Copa do Catar, e a sensação é de que o brasileiro não suporta o momento que tem para viver e procura mais uma maneira para protestar. Desta vez, contra a lista de Tite. 


Às vezes (e até me sinto um pouco infantil nesse aspecto) imagino, durante a convocação, um grupo de eleitores ansiosos para que o seu candidato seja finalmente eleito. Escuto, de repente, alguém repreendendo: “escuta!”, no mesmo instante faz-se um silêncio tremendo ao redor; todos prestam atenção como se estivessem aprendendo a ouvir pela primeira vez. 


No fundo da casa, nos corredores e no computador ligado em um canal do Youtube é possível, de repente, ouvir um alarido de reclamação: “Dani Alves convocado…”. A ordem, uma vez instaurada, desaba na cabeça daquela torcida que agora profere opiniões lamuriosas: “poderia ter convocado melhor”. Debaixo dessas declarações, cada um começa a fazer a sua própria lista de convocados. Reparo que entre aquela torcida excitada, apaixonada e fanática existe um desejo em participar da vida real, e viram técnico de si mesmos. 


Um dos torcedores resolveu, então, tentar alguma conversa e perguntou rispidamente a alguém ao seu lado “o que achou?”. Era notória a impaciência do outro que limitou-se a responder: “não achei nada”. Aquela afirmação me apareceu mais verdadeira do que a correção que a torcida (agora treinador) estava disposta a fazer. 


O seu mal-humor, no entanto, não se dava por conta da convocação, mas pela quebra de silêncio que há muito ficou extinta naquele local. O silêncio significa preferir não julgar, com a sua aparência mais velha achei possível que ele não quisesse se envolver com o barulho. 


Passados dez minutos após a convocação, a torcida faz uma afirmação profunda: “esse treinador estragou nossa alegria”. A expressão “esse treinador” me deu a impressão que quem assume a seleção já não é mais um um “homem” e sim alguém reduzido, insignificante e efêmero. 


Conclui que, como toda manifestação, a Copa do Mundo encolhe o ser humano, emagrece a sua definição e o transforma em estatística. Em um protesto, também ouvimos muito a multidão se referir a outro como: aquele soldado, aquele policial, aquele militante, e ninguém faz questão de indagar, porém, o seguinte: quem é aquele homem?


Olho para a televisão, agora com a imagem imóvel do técnico, apago o adjetivo inserido no seu ser e constato que só enxergamos de raspão qualquer um que se encontre  à mercê da aprovação do país. Sem se aprofundar em nossa visão, porém,  deixamos de nos envolver e esquecemos de dizer o óbvio: é um homem como um ser único, separado e excepcional.


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