Estrela Solitária



Alessandro Caldeira

"Hoje será o grande dia para o Botafogo. A partida contra o Palmeiras, pelas oitavas de final da Libertadores, determinará se o time pode se redimir do seu passado ou se continuará lutando eternamente por um futuro glorioso. No entanto, o jogo do Botafogo — este duelo contra os alviverdes — me faz lembrar de um velho amigo, que não tinha paixão por futebol, mas era fanático pelo cinema italiano.

Às vezes, me ligava às 4h da manhã — sua falta de sono era digna de um personagem shakespeariano — e perguntava com um tom de intimação: assistiu a Bertini? Era assim que ele se referia à atriz italiana Francesca Bertini, como se sua imersão nos filmes dela lhe conferisse uma intimidade especial. Sua admiração pela estrela do século XX era tão profunda que ressaltava, sempre com cuidado, ao falar de sua beleza: ela é capaz de provocar escândalos sem ser vulgar.

E eu discutia por horas sua visão sobre o cinema italiano e como os filmes daquele país haviam evoluído, mas sem perder a essência dramática de uma Itália implacável.

Em um bar, não havia pessoa que não guardasse na memória o principal assunto da mesa quando meu amigo chegava. Alguns homens diziam: chegou o Botticelli. Naquele ambiente, poucos sabiam o que ou quem era Botticelli, mas meu amigo se sentia lisonjeado com o apelido, que quebrava o silêncio para falar de seu assunto favorito.

Um dia, confessou, lembrando do filme mais recente da atriz: estou admirado! Sua admiração, segundo ele, era a sensação de que o tempo passava para todos, menos para o cinema italiano. Até mesmo Bertini, dizia, estava cada vez mais deslumbrante, trágica e feroz. Apesar de repetitivo, eu sempre concordava com ele. Realmente, a atriz sabia fascinar com seu olhar comovente.

Mas lembrei do meu amigo porque o Botafogo parece um cinema italiano. Assim como Bertini, com suas expressões dramáticas típicas do cinema mudo, o alvinegro carioca anseia por uma tragédia. Veja que a própria torcida se sente ferida quando não pode chorar pelo seu time. Entre os botafoguenses, ninguém está sem uma aptidão inata para o drama.

É só perguntar a qualquer botafoguense o que o deixaria mais triste, e ele dirá, com olhos brilhantes: ver seu time humilhado pela alegria. Uma vez, presenciei uma discussão entre minha prima e seu marido. Ele, corintiano, não hesitava em mostrar que fazia parte de uma torcida poderosa. Em uma dessas provocações, minha prima respondeu: te mato pelo Botafogo! Meu time é maior do que você! Ninguém imaginaria que, em sua docilidade, ela tinha uma paixão tão intensa capaz de levar ao extremo.

No fundo, o que ela queria dizer com toda essa agressividade era: eu me mato pelo Botafogo. Assim, ela confessava que seu time era tão importante que não se limitava a ser uma assassina, mas também uma suicida. Como o torcedor pode ser tudo isso ao mesmo tempo, pensava.

Eis tudo: qualquer outra pessoa pode torcer discretamente, ser comedida e até guardar em segredo o time do seu coração, menos o botafoguense. É, sem dúvida, o clube mais passional do Brasil. O fervor implacável de minha prima fez seu marido se sentir um torcedor secundário. No entanto, é nessa adoração, raiva e ira que reside o charme do torcedor botafoguense.

Seu adversário desta quarta-feira, por exemplo, seria capaz de se encontrar com o diabo para evitar o sofrimento, assim como um blues acenderia uma vela para descansar no abismo. No entanto, o verdadeiro botafoguense paga para sofrer. Assim como o cinema italiano, ele carrega em si a essência do drama.

O botafoguense precisa de uma derrota para se sentir completo. Como a viúva que entra em depressão por chorar a morte do falecido, o Botafogo faz o mesmo quando não pode lamentar uma derrota. Dizem que é difícil encontrar um botafoguense, mas eu digo que nem tanto; basta procurar no lugar certo. O velório, por exemplo, é um dos seus locais favoritos. É só entrar em uma capela e lá estarão os homens de General Severiano chorando a morte de um desconhecido.

Mas e hoje? O sentimento botafoguense não será diferente. Vocês se lembrarão que o Botafogo teve a chance de decidir o jogo no Nilton Santos. O quarteto formado por Marlon Freitas, Almada, Savarino e Igor Gomes fez a defesa palmeirense assistir ao seu espetáculo, mas deixou escapar a certeza de alegria para o jogo de volta quando Jhon não segurou uma bola fácil. Desconfio até que foi de propósito. A falha foi uma homenagem ao drama.

Assim como Graciliano Ramos, o botafoguense nos lembra que a vida é uma sucessão de asperezas e é inútil tentar suavizar a ferida com gazes. Mas, felizmente, mesmo que a classificação venha hoje à noite, o botafoguense ainda encontrará razões para se lamentar no pós-jogo, relembrando o tricampeonato perdido no ano passado."



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