Os Séquitos dos Anos 50



Por Alessandro Caldeira




Em meio a esse cenário, todos os séquitos se levantaram das arquibancadas e brincaram com os corações dos torcedores, levando-os a ataques cardíacos e ao aveludado beijo da morte.




M
esmo no declínio do sentimento romântico do futebol, vez ou outra, ele nos oferece visões espetaculares de seus principais atores dentro do seu gramado.
Ainda é possível perceber a torcida reunida em salas, sofás e bares conversando mutuamente com os acontecimentos do jogo ou o mais provável: rogando pragas para os seus adversários em prol de uma boa vitória de seu time.
Mas, em meio à beleza, à euforia e ao encanto subsiste a necessidade pelo terror. Um destino crasso. Uma ambiguidade hedionda.
É concebível que nesses momentos possamos ouvir as vozes dos séquitos e da figura sombria criado por Bulgákov caçoando da terrível contradição que é a vida.
A final da Copa de 50, decerto, foi o panorama dúbio de toda a trajetória de alguém que acompanha o futebol.
Certamente, o retrato desse estado dúbio, indeterminado e pueril que é a vida dentro da esfera do esporte se trata do goleiro Barbosa, que viu nos centímetros que dava entre a bola e os seus dedos o molde da linha tênue do nascimento de um herói ou vilão.
Durante a sua vida, era possível ver o camisa “um” exibir seu sorriso simpático para todos que desfilassem à sua frente. Porém, o gol do Uruguai parece ter acontecido em meio a um grunhido de um corvo, dizendo: “Nunca mais!”. 
O riso não foi mais o seu maior confidente após àquela final, deu-se lugar a um espírito nebuloso da melancolia, tristeza e ironia.
Não é de se admirar que um homem de sorriso fácil fosse considerado o culpado por aquele trágico acontecimento.

Porque assim que o jogo terminou, o brasileiro efusivo dentro do estádio desapareceu, mas deu lugar a um sombrio sentimento. Não seria justo que aquele homem não sentisse tal peso. “Às vezes a multidão é capaz até de torcer pelo estrangulamento de uma criança”.
Em meio a esse cenário, todos os séquitos se levantaram das arquibancadas e brincaram com os corações dos torcedores, levando-os a ataques cardíacos e ao aveludado beijo da morte.
Como numa condição hipnótica que leva a um sentimento de desordem, Barbosa se arrepiava, entrava em choque e declarava perante ao Maracanã que, aos seus olhos parecia mais um cemitério: ali dentro eu não piso.
É provável que o jornalista, responsável por entrevista-lo à época desse fatídico manifesto, nunca suspeitou que a causa desse terror pode ter vindo naqueles segundos finais onde a torcida gritava ao ver o jogador uruguaio agarrar a bola com as mãos: É pênalti! É pênalti! É pênalti! Três vezes como se quisesse afastar qualquer agouro.

Só que o sopro do apito enterrou as esperanças de Barbosa e todo o arrebatamento da torcida e disse: É só o fim, e nada mais.  

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