. É capaz, sim, de ouvi-lo
citar, enquanto a bola chega aos seus pés, um dos momentos do personagem
romântico de Goethe: “...Eu tenho tanta coisa e sem ela tudo se reduz a
nada.”
C
|
erta
vez, Nelson Rodrigues escreveu que é necessário coragem para enfrentar os times
argentinos, pois eles não apenas jogam, mas fazem do jogo um verdadeiro palco
de forças.
O
cronista estava certo identificando o perfil mais característicos dos
argentinos ao entrar em uma partida de futebol, faz parte do sangue patagão
tentar estabelecer-se, também, na força.
No
entanto, há de convir que os argentinos possuem um certo romantismo na sua vida
que vem direto do tango e é transferido para o seu jogo. Ah, com certeza se
Goethe tivesse visto uma partida argentina iria recorrer aos sentimentalismos
de Werther.
Todavia,
há um jogador que melhor expressou todo o romantismo que a Argentina carrega:
Román Riquelme!
É claro
que vocês, meus amigos, atentos como são, irão se perguntar de forma
ensurdecedora: E Maradona? E Messi? Alguns, um pouco mais antigos, na alma ou
no corpo, lembrariam: Dí Stefano?
Veja
bem, não há um jogador argentino que não possa se encaixar no gênero romântico.
Experimentem: coloquem uma música de Richard Wagner, agora, acompanhem uma
partida argêntea e, aposto, o ocorrido lhes tomarão de assombro tamanha a
sincronia da execução do corpo daqueles homens em campo juntamente com a
sinfonia do compositor alemão.
Eu posso
garantir a vocês que, com qualquer outro compositor, ou, seja qual for a música
com conotação romanesca, a percepção será a mesma.
Há
alguns jogadores, no entanto, que encaram o romantismo em formas diferentes,
diria até que, seguindo seus períodos. Maradona, por exemplo, não chega a ser
romântico sem mostrar suas obscenidades. Possui afinco e apreço pelo movimento
do corpo exagerado, pelo culto ao que é sagrado e profano.
Para não
me estender, a Argentina possui três fases do romantismo personificados em três
jogadores: Maradona, Riquelme e Messi.
O que me
faz pensar que Riquelme é o ultrarromântico do início da década passada, - é
possível que vocês também me achem adepto desse gênero pelos exageros dos meus
textos. É possível! É possível!
Mas,
faço-lhes uma proposta: assistam a um jogo do Boca Juniors, especialmente uma
partida contra o River Plate pelas quartas de final no ano 2000.
Ao
fazerem isso, concebam a si mesmos um momento de exercício mental para notar a
forma como Riquelme repousa a bola nos pés e tudo, de repente, é pausado enquanto
os seus companheiros o acompanham, deixando liderar a equipe para a vitória de
3 a 0. Descobre-se, nesse dia, o desabrochar de um camisa 10.
E,
talvez, filho de Werther. Ora, não sejam tão intimidados com a tentativa de
modéstia em seus sentimentos. É capaz, sim, de ouvi-lo citar, enquanto a bola
chega aos seus pés, um dos momentos do personagem romântico de Goethe: “...Eu tenho tanta coisa
e sem ela tudo se reduz a nada.”
Sim, meus amigos, é
preciso que Riquelme sempre veja a bola para que nada se reduza a pó.
No jogo citado, no
entanto, não foi isso que aconteceu. Román se colocava de um lado no campo,
esperando ansiosamente que a bola chegasse para que, finalmente se sentisse
livre e a levasse para todo canto.
Nesse instante, como
dizem na gíria do futebol: o camisa 10 deitou! Sim, deitou, e fez questão de
banhar-se com os gramados da La Bombonera para se juntar ao solo a fim de
demonstrar que seu futebol é espontâneo assim como a grama que cresce.
Dessa
maneira, como num filme francês, Riquelme encontrou um modo de escapar às lutas
apreensivas toda semana em solos argentinos para mostrar que há também algo que
germina no futebol: a magia.
Lances de
Riquelme vs River Plate
Nenhum comentário:
Postar um comentário