Por: Alessandro Caldeira
Somos auto sabotadores, relinchamos tentando
convencer-nos de que o resultado nos importa e não há melhor maneira para isso,
porém, quando nossos jogadores saem daqui, vemos o que eles podem fazer e passamos
a admirar as equipes onde eles atuam lá fora.
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erta vez,
Vanderlei Luxemburgo declarou que não há mais espaço para os jogadores que cadenciam,
ou pausam as jogadas porque os atletas que temos ultimamente não comportam esse
estilo, uma vez que são velocistas e tendem a implementar correria no ataque.
Luxemburgo
não foi errado ao dar tal afirmação, no entanto, a fala do treinador evidencia
um problema de nossos jogadores que é justamente a inexistência da “pausa”
durante os jogos.
Como insisto
em dizer, o futebol confunde-se com a vida, portanto, não é surpresa que nossas
equipes brasileiras estejam mais “ansiosas” pela chegada rápida ao ataque, pelas
definições (sem um bom acabamento) e pelo resultado imediato que toda essa velocidade
condiciona.
Não é
difícil percebermos o quanto nossos jogadores ficam frenéticos por acabar logo
com uma jogada, não se pode ter a bola nos pés que logo aparece a mania de se
livrar dela como se fosse um crime, um pecado que deixa exposto o quanto não
sabemos mais rolar a bola.
Hoje em
dia, é fácil de dizer, e eu fico triste em ter de concordar: se a bola depender
da forma como se joga aqui no Brasil, ela perderia seu ofício de caminhar pelo
campo. Aqui, a bola escorrega, assim como a um medíocre que não vive nenhuma experiência.
Mas, veja
bem: nossa torcida são auto sabotadoras. Digo isso porque o jogo que nos privilegiou
foi o da cadência, da pausa das jogadas e do ritmo. O jogador sempre foi lembrado
pela sua imprevisibilidade, habilidade e irreverência, mas também necessitávamos
das jogadas cadenciadas.
A seleção
de 70, por exemplo, como jogava? Não era apenas os dribles de Pelé, mas pausavam
a bola para terem uma noção da onde estavam, e para que a bola pudesse ser
vista realizando seu principal ofício. 82 foi a mesma coisa, sabia-se quando era
hora da bola e não dos jogadores.
Seleção de 70 e a pausa para atrair o adversário
Só que
como estava dizendo: somos auto sabotadores, relinchamos tentando convencer-nos
de que o resultado nos importa e não há melhor maneira para isso, porém, quando
nossos jogadores saem daqui, vemos o que eles podem fazer e passamos a admirar
as equipes onde eles atuam lá fora.
É por
isso que Nelson Rodrigues um dia declarou: “Partiu o escrete. Terminou seu
exílio.” Não enxergamos os jogadores por aqui, mas os números que ele pode colecionar
em suas equipes. Isso muda quando os jogadores vão para a Europa e podem jogar.
Por exemplo,
um dos maiores criadores que temos hoje em dia aqui no Brasil, chama-se Dudu. Sem
ele, o Palmeiras, do Vanderlei Luxemburgo, não teria uma equipe com cada vez
mais cara do jogo brasileiro. Ele é a cadência, a pausa, quando o jogo passa
por ele, todos os outros jogadores entendem o que é preciso fazer.
Mas olha
que engraçado, amigos, todos os analistas, os especialistas da “mãe-tática” esbravejam
dizendo que o lugar do Dudu é na esquerda e que o jogador não pode sair de lá.
Não sei se isso é mal entendimento ou inveja, mas brasileiro tende achar mais
cômodo quando o jogador não se arrisca.
Pois, eu
tenho a algo a dizer para vocês, amigos: o melhor lugar de Dudu no campo é aonde
ele quiser estar.
Lembro-me
das palavras de Zaratustra enquanto escrevo esta crônica: saber dançar é saber
mover-se no silêncio.
Podemos
dizer que a necessidade de pausar as jogadas é saber atacar os “silêncios” deixados
no campo, isto é: saber encontrar os espaços para nos desviarmos das rochas.
O último
jogo do Palmeiras foi assim. O Guarani era a rocha do time verde que, enquanto
não sabia mover-se no silêncio, várias vezes se chocava na rocha imposta pela equipe
paraguaia na defesa.
A versão "pausada" palmeirense quando resolveu sentir o jogo.
A pausa,
meus amigos, é a potência da qual Espinosa tanto fala: efetuar um bom encontro.
Assim como a nossa relação com a música preferida, ela parece ficar melhor
quando a levamos na mesma intensidade. Isso se trata de compor suas relações.
É
preciso fazer como se faz na poesia: transformar a velocidade e a lentidão para
potencializar o jogo jogado. É preciso deixar que o jogo também nos afete para
criar-se uma relação e experiência da partida. Afinal de contas, um homem com
pouca experiência torna-se pobre.
Portanto,
eis a verdade do jogo: primeiro a imagem, depois se preocupar em harmonizar. Quero
dizer, a imagem que um jogo reproduz é o corpo e deve-se senti-lo. Em seguida,
invadir o jogo assim como a uma música.
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